quarta-feira, maio 31, 2006

Christinia, a cidade Anarquista

Christiania: A Lenda da Liberdade No coração gelado do capitalismo europeu, na fria Copenhagen, Dinamarca, uma comunidade de 10 mil pessoas vive num outro compasso. Cristiania não tem prefeito, não tem eleição e funciona sem governo, sem imposição de leis que controlem a organização social. A lenda da cidade-livre da Dinamarca é real: inspirada no Anarquismo, Christiania resiste há mais de 20 anos, inventando um jeito novo de conviver com os problemas da vida comunitária. Limpeza das ruas, rede de esgoto, manutenção dos serviços básicos, tudo é decidido e feito a partir de reuniões entre os moradores da cidade.

Eles se definem como uma comunidade ecologicamente orientada, com uma economia discreta e muita autogestão, sem hierarquia estabelecida e o máximo de liberdade e poder para o indivíduo. Uma verdadeira democracia popular direta, onde o bom senso e o diálogo substituem as leis. No Brasil, poucos conhecem a história da cidade-livre.

Christiania começou a escrever sua história em 1971. Foi a partir das idéias de um jornal alternativo, o Head Magazine, que um grupo de pessoas, de idades e classes sociais variadas, decidiu ocupar os barracos de uma área militar desativada na periferia de Copenhagen. Era o início de uma luta incansável contra o Estado. A polícia tentou várias vezes expulsar os invasores da área, mas sem sucesso. Christiania virou um problema político, sendo discutida no parlamento dinamarquês. A primeira vitória veio com o reconhecimento da cidade-livre como um "experimento social", em troca do pagamento das contas de luz e água, até então a cargo dos militares, proprietários da área. O Parlamento decidiu que o experimento Christiania continuaria até a conclusão de um concurso público destinado a encontrar usos para a área ocupada.

Em 73 houve troca de governo na Dinamarca e a situação de radicalizou: o plano agora era expulsar todos e fechar o local. O governo decretou que a área seria esvaziada até o dia 1º de abril de 1976. Na última hora, o Parlamento decidiu adiar o fechamento de Christiania. A população da cidade-livre tinha se mobilizado para o confronto com o Estado, mas a guerra não aconteceu. O dia 1º de abril tornou-se o dia de uma grande manifestação da Dinamarca Alternativa. Ao longo dos anos, a cidade-livre aprimorou sua autogestão: casa comunitária de banhos, creche e jardim de infância, coleta e reciclagem de lixo; equipes de ferreiros para fazer aquecedores a lenha de barris velhos, lojas e fábricas comunitárias de bicicletas.

A década de 80 foi marcada pelas drogas. Em 82, o governo começou uma campanha difamatória contra Christiania: a cidade-livre era considerada o centro das drogas do Norte da Europa e a raiz de muitos males. A comunidade teve então que organizar programas de recuperação de drogados e expulsar comerciantes de drogas pesadas, como a heroína. O mercado de haxixe continua funcionando normalmente. O governo dinamarquês nunca deixou Christiania em paz, Vários planos foram elaborados visando a "normalização e legalização" da área.

Em janeiro de 92, finalmente um acordo foi assinado. Christiania já tinha mais de vinte anos de independência e provara ao mundo que é possível viver em liberdade. Mesmo com o acordo, o governo ainda tenta controlar a cidade-livre. A resposta veio no ano passado, com o lançamento do Plano Verde, onde os moradores de Christiania expressam sua visão de futuro e que rumos tomar. A lenda de Christiania continua sendo escrita.
Christiania: uma cidade sem governo

Christiania II: Uma Cidade sem Governo Christiania tem provado ao mundo que é possível viver numa sociedade sem autoridade constituída, sem delegação de poder através de mandatos e eleições. A cidade-livre da Dinamarca criou um experimento social definitivo contra a idéia dominante de que a humanidade se auto-destruirá se não existir um controle sobre a liberdade individual.

Os habitantes de Christiania decidiram correr o risco de andar na contra-mão da história. Para eles, o governo, seja lá qual for, e seus mecanismos de administração pública são sinônimos de burocracia, abuso de poder e corrupção.

Vivendo sem a necessidade de leis que controlem a organização social, cada morador da cidade livre tem que fazer sua parte enquanto cidadão e confiar que todos farão o mesmo. É uma nova ética de convivência, baseada na honestidade e na solidariedade.

Em 23 anos de existência, a cidade-livre sempre esteve associada a rebelião contra a ordem estabelecida e experimentando novos meios de democracia e formas de autogestão da administração pública. Christiania se organiza em vários conselhos, onde todos os moradores têm direito a opinar e discutir os problemas comunitários. As decisões não são feitas por votação, mas sim através do consenso. Isso significa que não é a maioria que decide e sim que todos tem que estar de acordo com as decisões tomadas nas reuniões. Às vezes, contam-se os votos somente para se ter uma idéia mais clara das opiniões, mas essas votações não tem nenhum significado deliberativo, não contam como uma solução para os problemas da comunidade. Christiania é dividida em 12 áreas, cada uma administrada pelos seus moradores, para facilitar o funcionamento dos serviços básicos. As decisões tomadas sempre por consenso podem parecer difíceis para nós, brasileiros acostumados ao poder da maioria sobre a minoria (pelo menos, é assim que se justificam os defensores das eleições).

Mas para os habitantes da cidade-livre, o consenso só é impossível quando existe autoritarismo, quando alguém tenta impor uma opinião sem dar abertura para que outras idéias apareçam e até prevaleçam como melhor solução. A experiência tem ensinado aos moradores de Christiania que cada reunião deve discutir só um assunto, principalmente na Reunião Comum, que decide sobre os problemas mais importantes da comunidade. E, contrariando o pessimismo dos que não conseguem imaginar uma vida sem governo institucional, a utopia está dando certo: a vida comunitária de Christiania preserva a liberdade individual e constrói uma eficiente dinâmica de relacionamento social, livre do autoritarismo e da submissão. A cidade-livre vive o anarquismo aqui e agora.
AÇÃO DIRETA

Os moradores da Christiania fazem questão de ser uma pedra no sapato do capitalismo. Eles não se contentam apenas em incomodar os valores tradicionais da sociedade européia com a vida alternativa que levam. Christiania também desenvolve várias atividades com o objetivo de contestar o sistema capitalista e divulgar as idéias anarquistas.

Durante os primeiros anos, a cidade-livre se tornou conhecida por suas ações no teatro e na política. E quem conseguiu maior sucesso nessa área foi o grupo Solvognen. Uma de suas ações diretas mais famosas foi em 1973, quando a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), uma espécie de braço armado dos Estados Unidos na Europa, realizou um encontro de cúpula em Copenhagen. Inspirados no programa de rádio "Guerra dos Mundos" de Orson Welles, que simulou uma invasão de marcianos colocando em pânico a população norte-americana na década de 40, centenas de pessoas, lideradas pelo grupo de teatro de Christiania, fizeram parecer que um exército da OTAN tinha ocupado a Rádio Dinamarca e outros pontos estratégicos da cidade. A impressão que se tinha era que a Dinamarca estava ocupada por forças estrangeiras. Durante várias horas, o país inteiro ficou em dúvida se a invasão era teatro ou realidade. A ação foi uma dura crítica a intervenção dos Estados Unidos na vida dos países europeus.

O Solvognen também usou a critividade para contestar o comércio da maior festa do cristianismo. Em 1974, o grupo organizou o primeiro Natal dos Pobres da Dinamarca. Milhares de presentes foram distribuídos por um batalhão de Papai Noéis. Detalhe: os presentes eram artigos roubados das lojas de Copenhagen. Resultado: foram todos presos, mas o escândalo ganhou as manchetes dos principais jornais da europa, com fotos de dezenas de Papais Noéis sendo carregados pela polícia. Até hoje o Natal dos Pobres continua sendo organizado como uma tradição e todo ano aproximadamente 2 mil pessoas recebem uma grande ceia em Christiania.

retirado da página http://www.brnpunk.cjb.net/
Essa é para quem acha que Bandido tem que morrer. Pelo menos mais de 30 pessoas das mais de 100 mortas pela polícia em represália aos ataques do PCC eram inocentes. Junte aí pelo menos mais umas 40 que não tinham nenhuma ficha policial. Ou seja, no mínimo 70 pessoas eram apenas "suspeitas". E se depois julgarem que elas eram inocentes? Quem vai devolver a vida para essas pessoas? Ou será que a pena de morte vai ser só para pobres? E quem disse que a função da policia é julgar alguem? Isso que eu saiba é função do Judicíario, por mais corrupto que esse poder seja.
E os verdadeiros culpados todos tomando Champagne em Brasília!!!

terça-feira, maio 30, 2006

Já está virando Rotina: Violência mais uma vez!

Se você acha que o discurso dos "esquerdistas" é sempre o mesmo você se esquece que o discurso dos "direitistas" também é. Sempre criticam o materialismo histórico sem ao menos terem lido uma página sequer do Capital, ou mesmo do pequeno Manifesto Comunista. E depois vêem dizer que a violência não é fruto da luta de Classes. A vocês com esse pensamento pequeno burguês só digo uma coisa: Estudem!!! Não apenas aquilo que vai lhes garantir salários maiores, mas sim aquilo que vai enobrecer o conhecimento como um todo. Sugiro um livro não tão extenso de começo, como por exemplo, "Por uma outra Globalização" de Milton Santos.

Espero que os que criticam os "esquerdistas" no Brasil um dia percebam que o que falta no Brasil não é mais presídios, mas sim mais escolas. O que falta no Brasil não são mais armas, mas sim mais livros. Aí talvez vocês percebam que o problema do tráfico é simples. Se o tráfico gera criminalidade talvez a descriminalização seja a solução. Veja por exemplo o caso da Holanda. Não existe tráfico de drogas simplesmente porque o comércio é legalizado. Com isso o poder sai das mãos dos "traficantes" que vocês tanto tem medo.

Mas, infelizmente o trafico ilegal gera mais lucro. E a nossa sociedade é hipócrita demais para lidar com o problema das drogas de frente. Melhor que lidar com o problema das drogas como um crime seria lidar como um problema social. Uma pessoa sem perspectivas de vida tem muito mais chances de se tornar um dependente do que alguém com sonhos de futuro. Seria então preferível que houvesse condições de todos os cidadãos se desenvolverem plenamente, assim então o consumo de drogas cairia muito. Mas, infelizmente, como eu já disse, o trafico ilegal gera mais lucro. E como nosso sistema prevalece a busca de mais lucro com o menor esforço talvez esse quadro só se altere com uma revolução social. Enquanto isso nosso povo sofre as conseqüências dessa guerra civil não declarada. De um lado a policia defendendo a Elite e a burguesia, e do outro o povo se defendendo como pode. E na maioria das vezes o povo fica completamente indefeso. Vítima das injustiças mais diversas.

domingo, maio 28, 2006

Fora. do eixo

O brasilianista inglês Kenneth Maxwell rebate a tese das duas esquerdas defendida pelo mexicano Jorge Castañeda e afirma que a Bolívia vive hoje um "terremoto" político e social

Jorge Araújo - 9.dez.2005/Folha Imagem
Os presidentes Hugo Chávez (Venezuela), Néstor Kirchner (Argentina) e Luiz Inácio Lula da Silva durante a 29ª Cúpula do Mercosul, em Montevidéu (Uruguai)


SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

A Bolívia é um terremoto, o peronismo, uma criatura que não morre nem com uma estaca no peito, e a América Latina como um todo hoje lhe surge como um mosaico de respostas específicas a estruturas políticas decadentes.
Não se pode negar que o historiador Kenneth Maxwell seja bom de imagens. A seus olhos, nosso continente pode estar à beira de um momento de virada e renovação tanto da ação quanto do discurso político.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista que o brasilianista, autor de "A Devassa da Devassa" (ed. Paz e Terra), concedeu à Folha, por e-mail.

FOLHA - Existe uma impressão generalizada na mídia internacional de que a América Latina vem se voltando para a esquerda. O que acha? KENNETH MAXWELL - É verdade. Mas é também um modo preguiçoso de pensar. Pessoalmente, creio que "esquerda" não é uma categoria que possa ser muito útil ou adequada. A idéia de que há uma esquerda "certa" e uma esquerda "errada", descritas por Jorge Castañeda em artigo na revista "Foreign Affairs" [leia na página ao lado] é uma visão puramente instrumental.
Em muitos aspectos, essa é uma versão mais sofisticada da velha idéia de "eixo do mal", mas servida de modo tão delicado que os gringos liberais a podem engolir de uma vez só -algo que, aliás, eles já fizeram.
Lembre-se de que muitos desses colocaram Lula na categoria de esquerda "errada" antes de ele assumir e, agora, ele é o herói da esquerda "certa".
Mas é verdade que existe hoje uma crise política de governabilidade na América Latina. E não é fácil colocar nessa crise um rótulo. Na verdade, nós podemos estar testemunhando um daqueles momentos de virada histórica, quando novas coalizões e novos discursos políticos emergem.

FOLHA - Como o sr. diferencia essas esquerdas? MAXWELL - Existem muito poucos socialistas utópicos à moda antiga na América Latina hoje, mesmo em Cuba. Castañeda estava certo sobre isso em seu "A Utopia Desarmada" (1994, editado no Brasil pela Cia. das Letras). A visão marxista foi enterrada no final da Guerra Fria.
Em parte porque ficou impossível achar que algo da experiência soviética pudesse se salvar. Mas também porque, de uma perspectiva latino-americana, o poder soviético serviu de contrapeso aos EUA.
E muitos intelectuais latino-americanos de classe média, de aspirações nacionalistas profundas, mas de convicções superficiais de esquerda, se agarraram à União Soviética.
Mas é preciso ter em vista que também é verdade que as alternativas mágicas prometidas pelo "mercado" também não funcionaram no continente. Pelo menos a maioria da população da América Latina, e certamente a maior parte da população da Bolívia, parece acreditar fortemente que essas políticas faliram. E quem pode dizer que estão errados? Eles devem saber. Tiveram de viver as conseqüências de políticas falidas no seu dia-a-dia.

FOLHA - Como o sr. vê o continente politicamente, então? MAXWELL - Trata-se de um mosaico de respostas específicas a estruturas políticas decadentes, cada vez mais altos níveis de desigualdade e exclusão social, tendências crescentes de migração interna e externa, tudo misturado a uma impressionante capacidade de comunicação através de regiões geográficas e de classes e etnias. O colunista do "New York Times" Thomas Friedman chama isso de horizontalização do planeta.
É justo. Mas acho que essa interpretação deixa de lado uma dimensão importante. A terra plana é, na verdade, um solo plano que tem portas escondidas para porões planos, e esses porões, por sua vez, são interconectados também.
Nos níveis mais altos, existe comércio, fluxo de capitais, troca de conhecimento e o poder da internet para comunicações transnacionais e nacionais.
Nos níveis mais baixos, anéis de prostituição infantil, pedofilia, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. Além disso, celulares que podem provocar levantes nas prisões e colocar bombas em carros.
E, no meio, existe a imigração clandestina, garçons brasileiros em restaurantes de Boston, mexicanos colhendo uvas e alface na Califórnia.
Então, alguns dos efeitos desse complexo de mundos horizontalizados são bons. Mas alguns não são tão bons.
E os países não estão tão bem organizados para lidar com esse novo mundo de pisos planos, especialmente com Estados fracos ou corruptos ou, ainda, Estados que não podem controlar grandes áreas de seu próprio território.

FOLHA - O sr. acha que as novas versões de populismo surgidas no continente são uma resposta a isso? MAXWELL - Em alguns aspectos, sim. Álvaro Uribe [presidente da Colômbia] não é de esquerda, mas tem muito de um líder populista na prática, ainda que não em sua performance pública. E os colombianos também sabem como manipular os EUA a seu favor.
Quanto a Ollanta Humala [candidato à Presidência peruana], é difícil saber em que vai se transformar, se for eleito. Chamá-lo de "nacionalista" seria caridoso demais. Já [a presidente do Chile, Michelle] Bachelet tem um estilo de governante social-democrata europeu. Já [o presidente da Venezuela, Hugo] Chávez sempre me causou a impressão de ser um tipo de líder latino-americano muito antigo, uma espécie de caudilho modernizado.

FOLHA - E Lula? MAXWELL - E Lula? Bem, o esquerdismo de Lula estava fora do mercado todo o tempo. Lula nunca foi um ideólogo. Seu "modus operandi" me parece similar, na prática, ao dos chefes que emergiram dos sindicatos nos EUA. Onde havia -e há, ainda- muito desse papo de "irmão" isso, "irmão" aquilo.
Eles derramam muitas lágrimas quando as greves do passado são mencionadas, mas, hoje, fazem barganhas por trás da cena, negociações com chefes e manipulam fundos de pensão.

FOLHA - E Néstor Kirchner (presidente da Argentina)? MAXWELL - Bem, Kirchner é um peronista. O que mais pode ser dito? Os peronistas são de esquerda? Depende da estação e do que é necessário em cada momento particular para se manter no poder.
No final do mistério do peronismo, pode estar o mistério da política latino-americana. Que, diferentemente do Drácula, mesmo com uma estaca cravada no peito, não morre.

FOLHA - E Evo Morales (presidente boliviano)? MAXWELL - Pensar no que Evo Morales representa apenas como um fenômeno de esquerda é equivocado. O que está acontecendo na Bolívia é um verdadeiro terremoto. Isso realmente é algo novo e imprevisível. Não há absolutamente nenhum exagero em dizer que, pela primeira vez em 500 anos, a maioria está governando aquela região dos Andes.
E essa é uma maioria indígena que vem sendo sistematicamente, e às vezes brutalmente, excluída do poder por séculos. Uma maioria que sabe disso e se lembra disso.
Será uma tendência na América Latina como um todo? Não, com certeza não. Mas terá grandes conseqüências na região andina, onde existem grandes populações indígenas que vêm sendo exploradas por séculos. E que podem agora se comunicar e se conscientizar de seu poder.

FOLHA - Que solução vê para os problemas latino-americanos hoje? MAXWELL - Não há uma resposta fácil para essa pergunta. Eu certamente não tenho uma. O que é necessário é pensar muito e com criatividade.

E de uma coisa eu tenho certeza. Classificações binárias e simplistas de uma "boa" e uma "má" esquerda são politicamente impróprias. Se fosse apenas a palavra, seria simples. Mas a realidade é muito mais complicada e, infelizmente, muito menos previsível.

Minhas verdades

Existem algumas pessoas que crêem que há verdades que são duras demais para serem abertas à sociedade. Como se algumas verdades ferissem. Não creio que existam verdades que devam ser escondidas. Por mais dura que seja ela deve ser dita, para aqueles que a desconhecem poderem aprender o que a verdade tem a ensinar. Esconder uma verdade é como cobrir os olhos com a mão, imaginando que assim o sol para sempre se esconderá.

Se as verdades forem escondidas em breve nos esqueceremos das mortes causadas pelas bombas atômicas, da dor de todas as guerras, das brutalidades cometidas em nome de deus, e da fome daqueles que não tem dinheiro para comprar um pão. Tudo porque essas verdades são duras demais. Prefiro mil vezes a dor de uma verdade do que a falsa alegria de uma mentira. Acho que mais que uma verdade, o que mais fere a sociedade é a mentira, a enganação, a hipocrisia. A dor de uma verdade é o caminho para a solução daquilo que realmente fere. Já a mentira, enganação e a hipocrisia são os instrumentos para ferir cada vez mais, já que elas apenas encobrem os verdadeiros males da sociedade.

sábado, maio 27, 2006

sexta-feira, maio 26, 2006


SÃO PAULO – O balanço divulgado na noite de quinta-feira (18) pela Secretaria de Segurança Pública do governo de São Paulo totaliza em 152 o número de mortos na onda de violência que atingiu o estado na última semana. Destes, 107 foram mortos pela polícia em supostos confrontos. Muitos ainda não tiveram seus nomes divulgados e dezenas de corpos estão no IML (Instituto Médico Legal) a espera de identificação. Na quarta-feira, tiveram início as primeiras denúncias de que a polícia estaria cometendo abusos no combate aos ataques do PCC, o Primeiro Comando da Capital. Casos que começaram a estampar as páginas dos jornais e que agora não pararam de chegar às organizações de defesa dos direitos humanos.

Na quinta-feira, o escritor Ferréz fez um apelo à população em seu blog, para que todos ajudassem a divulgar que “a Policia Militar e a Policia Civil, afetadas com a onda de matança, estão fazendo da nossa periferia um estado pra lá de nazista”. “Não está acontecendo confronto, e isso é uma prova que todos vão ter em alguns dias, quando a mídia começar a ir atrás de novas notícias e decidir falar a verdade. Não adianta ofender, não adianta ameaçar, a boca só se cala quando a guerra não for injusta”, escreveu.

Reginaldo Ferreira da Silva – o nome literário é uma homenagem a Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião (Ferre), e a Zumbi dos Palmares (Z) – nasceu no Capão Redondo. O bairro, na Zona Sul de São Paulo, é considerado uma das regiões mais violentas da capital. Filho de um motorista e de uma empregada doméstica, ele escreveu os primeiros versos aos sete anos de idade. Trabalhou como chapeiro numa lanchonete, balconista em bar e padaria, foi vendedor ambulante de vassouras e auxiliar-geral numa empresa metalúrgica antes de publicar suas primeiras obras. É autor de Fortaleza da Desilusão, Capão Pecado e Amanhecer Esmeralda. Em 1999, fundou a 1DASUL, um movimento que promove eventos culturais em bairros da periferia. E, em 2001, lança a revista Literatura Marginal, em parceria com a revista Caros Amigos, que recebe o Prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte de Melhor Projeto de Literatura.

Firme e forte, como “um elo da corrente”, como ele sempre escreve, Ferréz concedeu à CARTA MAIOR a entrevista abaixo:

CARTA MAIOR – Você denunciou em seu blog que a polícia matou quatro jovens inocentes esta semana no Capão Redondo. Como isso aconteceu?

FERRÉZ – Todos os dias de manhã, eu vou a um bar tomar café. O bar fica em frente a uma pequena loja de camisetas que eu tenho lá na rua. Todos os dias eu via esses meninos lá. Um deles vendia flor, o outro, produtos de limpeza. Estão sempre lá tomando café também antes de irem trabalhar. Na segunda-feira, cheguei no bar e estava um movimento estranho. E aí me falaram que os caras tinham atirado nos meninos no domingo à noite. Eles estavam tomando cerveja numa barraca de lanches. Isso foi numa rua próxima, onde todo mundo sempre vai. Um lugar conhecido no bairro. Chegou um carro preto – alguns moradores disseram que viram uma viatura também –, desceram cinco homens de touca ninja e atiraram nas pessoas na barraca. Até o dono foi alvejado. Quatro morreram e três estão no hospital ainda. Um se chamava Maurício e o outro, "Brigadeiro". Mas a polícia não divulgou ainda o nome dos mortos. O mais velho tinha 27 anos e nenhum estava envolvido com o crime. Dos três que estão hospitalizados, nenhum tinha passagem pela polícia. No Parque Ipê, que é uma favela, colocaram fogo na moto de um menino que entregava pizza. Ele também morreu. Invadiram as casas das pessoas, uma por uma. Invadiram as casas no meio da madrugada.

CM – Nesta quinta-feira, a polícia realizou uma operação com 400 homens no Jardim Helba, usando um mandado coletivo de busca. O que você acha dessas operações?

FERRÉZ – O estranho disso tudo é que não foi a população que declarou guerra à polícia militar. Foi o PCC. E quem está pagando é a população. A polícia recebe coação há tempos dos bandidos; ela criou este estado. E agora está guerreando com isso, porque solta as pessoas com alto grau de periculosidade. E quem paga é o povo, porque o cara do PCC não fica moscando na rua de bobeira. Aí a polícia pega o popular, confunde com outra coisa, e "ripa" o pessoal da favela. Tinha que ter mandado coletivo em Brasília, porque lá já foi provado que as pessoas são criminosas. Mas é mais fácil entrar na casa da população e bater num pobre do que olhar no olho de um ladrão, porque eles tremem quando isso acontece.

CM – Tremem por que? Você acha a polícia despreparada?

FERRÉZ – A polícia tem vontade de fazer alguma coisa e acaba fazendo com as pessoas, por despreparo dos policiais. As pessoas que estão morrendo agora não são culpadas. Me revoltei por isso. Por que é assim, matou e enterrou? A vida do cara é isso? Espera aí! O cara foi assassinado e isso não vai ser investigado porque ele é pobre? A polícia científica esteve no lugar em que os meninos morreram e começaram a perguntar pras pessoas se eles eram “nóia”. Ou seja, estavam procurando alguma razão pra justificar depois as mortes. Este é o único país em que o morto é culpado. Você morre e ninguém investiga. Estamos recebendo várias cartas de outras pessoas denunciando isso. Não é possível que todos estejam mentindo. Não é possível que fique assim. Estão escondendo os corpos porque é tudo execução, com tiro na cabeça. Hoje os policiais estão desfilando aqui na rua com touca ninja e camisa Le Coq, que é um grupo de extermínio da polícia.

CM – Mas não é de agora que há denúncias de grupos de extermínio agindo na periferia com a participação de policiais. Em que a situação atual diferente da de antes?

FERRÉZ – Apanhar da polícia não é novidade. A polícia sempre pega as pessoas, bate, espanca, não acha nada e fica nervosa. A PM pega as pessoas e diz que elas são lixo, dão bronca porque não têm roupa, porque estão “desarrumados”. Muitas pessoas acham isso estranho porque moram do outro lado da cidade, onde os cidadãos são tratados como seres humanos. Aqui é diferente. Mas chacina não tinha há muito tempo. Um cara entrar na viatura e sumir sempre tem. Mas chacina do jeito que está não tinha. E a mídia não reportou a chacina. Como 107 podem ser mortos suspeitos? Depois que a pessoa morre, como é que você recupera a vida dela?

CM – Como está sendo a atuação da polícia esses dias no Capão Redondo?

FERRÉZ – Estão pegando qualquer um que tenha ficha. Se tiver passagem, apanha. Tenho um amigo que foi solto há dois anos, estava trabalhando, sossegado. A polícia pegou a ficha dele e veio atrás. No sábado, ele foi às Casas Bahia pagar uma conta e, quando voltou, a polícia o seguiu, o pegou, levou e bateu muito nele. Deu choque, bateu com pedaço de pau. Ele estava com outro amigo. Depois foi solto. Agora ele não sai de casa mais, está super nervoso, não conversa com ninguém. Está revoltado de novo, porque estava trabalhando sossegado. Mas é assim que você cria uma fábrica de fazer vilão, pegando pessoas que não têm nada a ver. A guerra é entre o PCC e eles, e não com a população. Não temos que pagar por isso, não lucramos nada com isso.

CM – Diante do quadro histórico do país, você acha que essa crise de violência demorou para explodir aqui em São Paulo?

FERRÉZ – Essa situação existe há muito tempo e as pessoas não queriam ver. Há quatro anos publiquei um artigo na Folha de S.Paulo que já falava isso. Era pela guerra e pelo terror ou pela arte. Ninguém tem arte, cultura, informação. A prisão não reeduca, só repreende. O caminho é esse, o Estado vai se fortificando e já era. Mas hoje o Estado está submisso. Tinha que fazer política pública de segurança de verdade, e não brincar com a população. O Furukawa [secretário de Administração Penitenciária] e o Saulo [Abreu de Castro, secretário de Segurança Pública] estão brincando há muito tempo, até com a vida dos policiais, que estão abandonados. O cara está na rua, no combate corpo-a-corpo e não tem preparo, não tem curso, não aprende. Aí fica um brutamonte contra o outro na rua, e nós no meio, desarmados, querendo trabalhar.

CM – As pessoas estão conseguindo trabalhar esses dias?

FERRÉZ – As pessoas estão arriscando a vida para trabalhar. Tenho dois cunhados que voltam de noite pra casa, se arriscando. Mas as pessoas têm que ganhar o pão delas. O comércio aqui está fraco, está um clima estranho, as pessoas não saem de casa.

CM – Os senadores e deputados em Brasília devem aprovar nos próximos dias um pacote de leis para aumentar o combate à criminalidade. Há propostas com forte linha repressora. Você acha que este é o caminho?

FERRÉZ – Acho que o Estado está fazendo corda pra se enforcar. A elite já é suicida há muito tempo e agora o Estado está sendo. Quando você reprime uma criança no primeiro dia, ela sorri pra você. No segundo, já faz uma cara de desconfiada. No terceiro, ela te olha de cara feia. Tenho um amigo que diz que quando você prende um cachorro e todo dia chuta ele um pouco, quando você o solta ele te morde, e não te faz carinho. O sistema carcerário é a mesma coisa. Ele tem que ser uma tentativa de restabelecer o convívio do preso, e não só a sua punição. Quando ele for pra rua, vai reagir. Acho que essas leis são um tiro na testa. A questão do Brasil é de educação, desde o primeiro ano. Só que ninguém faz nada. Todo mundo que é um pouco mais esclarecido sabe que o negócio é mais embaixo. Mas infelizmente a coisa vai sendo levada na brincadeira. Essas leis de agora são medidas políticas, que fazem um governo aqui brilhar mais do que o de lá.

CM – Você falou que a elite é suicida há muito tempo. Por quê?

FERRÉZ – Em um estado onde uma pessoa tem milhões e a outra não tem o que comer no dia, esses mundos acabam se encontrando um dia. E é claro que vão se encontrar, porque é a gente que limpa a casa deles, que cuida da segurança deles, que dirige o carro deles. Não tem como um cara carregar uma carroça o dia inteiro e ver um Audi ali do lado, com um cara no ar condicionado confortável, e dar tchauzinho. As pessoas vão tomando ódio, porque querem que o seu filho também tenha respeito e educação, querem que o posto de saúde funcione, que os policiais não entrem na sua casa. Não é brincadeira. O dia em que a população estiver conscientizada, não vai ter como conter isso. Vai chegar uma hora que o povo vai gritar. Falamos que o brasileiro é pacato, mas quando a bomba explode, olha o que acontece? As pessoas trabalham doze horas por dia e não têm pão pra colocar na mesa. Isso é culpa de quem, do pobre?

CM – O governador Cláudio Lembo deu uma entrevista para a Folha de S.Paulo em que responsabilizou a elite sobre o que está acontecendo. O que você acha disso?

FERRÉZ – Todo cara da elite retrata a elite como se fosse o outro. A elite sempre é o cara que tem mais do que eu. Eu tenho pouca terra, tenho pouca Mitsubishi, pouco Chrysler. Mas elite é o outro, que tem iate. A elite não se enxerga como elite. Ninguém é culpado...

CM - Você é de uma região que já foi considerada uma das mais violentas do mundo. Ainda há um estigma da classe média e da classe alta em relação à população da periferia?

FERRÉZ – Pra mim, muita gente da classe média e da classe alta também é ladrão. Vivem explorando os outros. Eu acho que tínhamos que abrir a conta dessas pessoas, fazer uma reviravolta no passado delas. Os bancos estão ganhando 60% de lucro por ano num país que é miserável. Algo está errado. Não é à toa que queimaram as agências bancárias. Depois falam que o crime não está politizado. Tem coisa mais politizada que queimar agência bancária?

CM – Há regiões da cidade em que a população diz que tem mais medo da polícia do que dos criminosos, porque não sabe que tipo de comportamento esperar dos policiais. Você concorda com isso?

FERRÉZ – Sim. A farda causa uma coisa estranha. Você conversa com um policial num dia e, no outro, se ele passa na viatura, nem fala com você. Tem uns policiais do bairro que vão na minha loja, pedem desconto, e no dia em que estão fardados nem me olham na cara. Não não existe polícia que sorri pra uma criança, que fale bom dia. A polícia comunitária é uma piada. Nunca vi isso, é um fracasso. É a mesma arrogância e prepotência; não mudou nada. Já os bandidos mataram apenas um civil, a namorada do policial, porque ele bateu o carro e ela estava dentro. Pelo lado dos policiais, quantas pessoas morreram? Acho que a máscara vai cair uma hora. Quando divulgarem os nomes, vão ver que muitas das pessoas não têm passagem, não têm nada a ver com a coisa. Isso se contarmos somente as mortes que foram assumidas, porque o IML falou que está cheio de cadáveres que não há como identificar. E os massacres que não entraram no índice? Além da morte desses quatro meninos, um outro morreu no Parque Santo Antônio e mais dois foram atingidos num campo de futebol. A viatura chegou, os caras saíram de touca ninja, mandaram os caras que estavam conversando no campo à noite se ajoelharem e atiraram nos moleques. Um morreu e o outro está no hospital. De dia são as abordagens pra bater. De noite, o bicho está pegando.

CM – Esta noite não houve mortes, pelo menos divulgadas. Você acha que a situação se acalmou?

FÉRREZ – Não sei. Estou como a população de São Paulo. Sem saber o que vai acontecer.

quarta-feira, maio 24, 2006

A Violência em São Paulo







Os últimos acontecimentos em São Paulo nos fazem refletir várias questões extremamente importantes para a compreensão da conjuntura atual do Brasil. Primeira questão: Porque existem tantos presidiários no Brasil? Para respondermos a essa questão devemos voltar ao Brasil pré-libertação dos escravos. O regime escravagista não se sustentava mais. Era cada vez maior a pressão internacional para que os escravos passassem a ser trabalhadores assalariados. Assim o mercado consumidor mundial aumentaria, pois haveriam mais consumidores. O problema se constituiu na seguinte dicotomia: A escravidão foi abolida, a discriminação racial não. O escravo liberto não seu tornou necessariamente um empregado assalariado. Os senhores das terras muitas vezes preferiam dar emprego a imigrantes europeus, brancos, do que a negros (considerados raça inferior naquela época) recém libertos. Sendo assim restava ao ex-escravo partir em direção as cidades, que já na época, não tinham condições estruturais, nem políticas públicas, para abrigar mais moradores.

Restava aos ex-escravos, junto com outros imigrantes que vinham para as cidades, a marginalidade - marginalidade no contexto geográfico, pois os novos habitantes das cidades brasileiras se instalavam em suas margens, nas áreas ainda sem infra-estrutura das cidades - e também a marginalidade econômica, pois não havia trabalho para todos os novos habitantes do Brasil. A classe dominante ainda estava acostumada com o regime escravagista e de superioridade racial, e por isso não houve uma preocupação com essa nova parcela da população que estava sendo incorporada ao País.

A única preocupação real da ascendente burguesia, e da decadente classe rural brasileira do final do século XIX, era o lucro. Todos queriam lucrar o máximo possível para adentrarem no rentável comercio da revolução industrial. Lucro maior significa mais exploração da força de trabalho, sendo assim, o salário era o menor possível, e cada vez mais pessoas eram empurradas para o que ouso chamar de “marginalidade tupiniquim”, ou seja, aqueles que não tinham lugar na recém surgida sociedade capitalista brasileira. A marginalidade tupiniquim buscava na informalidade meios de sobreviver em uma sociedade em que o mais importante era o lucro. O aumento da criminalidade, e da marginalidade no Brasil se deve não pela libertação dos escravos, mas sim pela manutenção de um sistema baseado na exploração. Essa marginalidade tupiniquim buscará na informalidade os meios de sobrevivência. Seja vendendo sua força de trabalho em troco de um prato de comida, seja partindo para a execução de atos ilícitos.

Sendo assim a marginalidade está diretamente ligada ao nível de exploração da força de trabalho. Quanto maior for a exploração maior será o índice de marginalidade da sociedade. Quanto maior o lucro de alguns poucos sobre a maioria dos trabalhadores assalariados, mais violenta será a resposta da parcela excluída do mercado de trabalho. A violência da margem da sociedade nada mais é que do que o reflexo da violência diária da sociedade de consumo sobre os excluídos do processo econômico. Estes por sua vez querem adentrar no processo econômico, sem perceber que, o que gera sua exclusão é o próprio sistema da busca incansável pelo lucro imediato. O mesmo sistema que colocou na marginalidade os milhões de negros recém libertos do fim do século XIX.

Segunda questão: O que educação tem a ver com a violência? Se essa questão tivesse sido levantada com a chegada dos portugueses a 500 anos atrás com certeza nossa realidade hoje seria outra. Se ao invés de pensar somente no lucro imediato os europeus que aqui chegaram tivessem aprendido a conviver com a natureza, como os índios o faziam, teríamos tido uma sociedade mais justa e igualitária, pois no regime tribal em que os índios viviam não havia exploração do trabalho em busca do lucro. Mas, ao invés disso, o que prevaleceu foi o sistema de lucro imediato. Sem preocupação com o futuro. E a preocupação com o futuro é uma das principais características de uma sociedade em que a educação é levada a sério. Pois de outra forma, em uma sociedade sem o investimento necessário em educação, os cidadãos não conseguem perceber a importância do futuro em suas vidas.

O sistema de lucro imediato que prevaleceu por aqui se preocupava muito mais com a repressão a marginalidade do que em maneiras de inseri-la dentro da sociedade. A inserção da massa marginal na sociedade atual acarretaria em menos lucros para os detentores dos meios de produção, pois seriam mais pessoas para divisão das riquezas acumuladas com a exploração da força de trabalho assalariada. Por isso hoje é tão comum a construção de presídios, e tão rara é a construção de escolas. Por isso o investimento em armas é maior do que o investimento em livros, pois não há uma preocupação real com o futuro. Na nossa visão imediatista mais igualdade social significa menos lucros para os capitalistas. E acumulação de capital na atual sociedade brasileira é sinal de “stauts social”. Já o conhecimento, a educação, é vista como um perigo de subversão dos valores, pois quanto maior o índice de conhecimento de um povo maior é a tendência da busca por igualdade. A principal preocupação brasileira é hoje a mesma dos portugueses que aqui chegaram por volta de 1500. Ou seja, o lucro sem preocupação com o futuro, o jeitinho brasileiro, o pensamento de se levar “vantagem” em tudo. Pensamento esse que esta saindo mais caro do que o investimento em educação.

Talvez o terceiro questionamento seja o mais polêmico: Porque tanta violência? O que vivemos hoje é o resultado de uma história de 500 anos de injustiças. Por mais de 500 anos uma grande parte da população foi largada a margem, sem que houvesse o mínimo de preocupação humanitária para com os excluídos do processo econômico. A estes restavam vender sua força de trabalho por salários que não garantiam a sua sobrevivência, ou então a busca de fonte de rendas na criminalidade.

A policia também tem seu papel importante no contexto atual. Mais que garantir a segurança de todos os cidadãos, durante a história do Brasil, ela serviu para garantir a manutenção do “status qüo” e a repressão dos marginalizados que lutavam pela sobrevivência. Por isso são tão constantes as chacinas promovidas nas favelas e nos bairros periféricos. As chacinas quando produzidas por grupos de extermínio não passam de limpezas promovidas por aqueles que na verdade deveriam proteger o povo. Vale lembrar também que as chacinas são patrocinadas por pequenos comerciantes que querem se ver livres da ameaça dos “marginais”. É comum também a invasão de domicílios, por parte dos agentes da “lei”, sem mandatos de busca. Os barracos eram revirados, seus moradores humilhados, e várias pessoas eram mortas, por morarem em barracos nas favelas. A policia do estado acabava por executar inocentes, criando assim a pena de morte no Brasil.

Aos marginalizados resta a opção da criação de sua própria segurança, buscando também o lucro imediato, através da organização do trafico de drogas. O trafico organizado acaba por assumir nos bairros periféricos o papel que deveria ser da justiça oficial, ou seja, a proteção dos seus moradores. Acaba sendo responsabilidade do trafico organizado punir os pequenos delitos cometidos dentro das comunidades periféricas. Acaba sendo do trafico organizado também a função de proteger os moradores para que não sejam vítimas de chacinas promovidas pelos agentes da “lei”, pois em muitos bairros a policia não pode “agir” por conta do controle total do tráfico organizado.

Se hoje vivemos esse clima de guerra civil no país não podemos esquecer que ela é fruto de nossa própria história. Ela não surgiu do “nada” sem motivos específicos. Ela é o resultado da história de exploração de nosso povo. Da história da discriminação presente na mentalidade dominante de nosso país. Ou seja, o que vivemos hoje é o reflexo de 500 anos de violência dos poderosos sobre os oprimidos no Brasil.